A Douro Bats mostra que a bola, quando nasce, é redonda para todos
Neste sábado, 14 de outubro, o Pavilhão Nicolau Nasoni acolhe a primeira edição do Bats InterCup, um torneio composto por equipas de futsal inclusivas. É aqui que reside a novidade. Por serem inclusivas, porque não têm medo de o assumir, por mostrarem que é nessa diversidade que se ganha mais e melhor. Fomos conhecer melhor os mentores do torneio, os Douro Bats.
Três formações são da casa, duas chegam de fora . O cartaz está arrumado para a primeira edição do torneio, que se realiza “de uma forma amigável”, sem grandes competições. Para isso dividiram a equipa da casa em três grupos (A, B e C) e convidaram mais duas – a Lisbon Foxes e a Boca Seniors – para integrarem esta competição.
A opção pareceu lógica, por ter ainda um carácter semiprofissional, mas, ao mesmo tempo, por não ser fácil encontrar equipas de futsal que sejam inclusivas. “Qualquer que seja a justificação, a verdade é dura, crua: o futebol é das últimas barreiras homofóbicas, sexistas e racistas que temos de destruir”.
A frase é direta, lançada sem medos por Vítor Gonçalves, o responsável pela formação da equipa Douro Bats, em 2021. Tudo aconteceu quando, entre amigos, se apercebeu que alguns apaixonados pelo futsal e futebol não encontravam o seu lugar para praticar livremente a modalidade. “Um espaço onde toda a gente se pudesse sentir bem a praticar desporto”, acrescenta.
Assim nasceu, sem qualquer ambição de ser mais do que um sítio de encontro entre iguais, a Associação Desportiva Douro Bats. A porta estava aberta a todos, embora primeiramente mais direcionada para a comunidade LGBTQIA+. Era o lugar que faltava, o espaço de liberdade que precisavam, o recinto onde pudessem ser quem são na realidade, sem medo do olhar avaliador do outro, da desconfiança. Porque sabem que o olhar existia. Existe. Continuará a existir. “Mas é com associações como a nossa que queremos fazer a diferença”, assume Vítor.
Porta aberta a todos
Os elementos da associação sabem que a palavra “inclusiva” pode servir de graça entre os demais. Mas é fácil de entender. É inclusiva porque “não temos critério de género, orientação sexual, raça ou nível competitivo”, assume o responsável. É inclusiva porque todos podem fazer parte. Heterossexuais? Sim. Homossexuais? Sim. Bissexuais? Também. E não-binários? São bem-vindos. Transexuais? A porta está sempre aberta. “O único requisito é mesmo querer e estar disponível para jogar futsal”. Simples.
Atualmente, a equipa conta com 40 atletas. Os treinos decorrem duas vezes por semana, “um deles com treinador”, “e geralmente tentamos que haja sempre um tempo de treino técnico e jogo com divisão por níveis competitivos”. Nesta época desportiva abriram uma nova modalidade, de voleibol, que tem ainda uma procura inexpressiva. Mas é um passo em frente, que corrobora o estado de espírito atual. “Sentimos que a aceitação do projeto tem sido enorme, quer dos meios de comunicação social quer da própria Câmara do Porto, que através da Ágora apoia este nosso primeiro torneio”, revela. “E também eles têm sido importantes para a continuidade e crescimento da associação”.
Do medo à determinação
Porque ao medo de crescer em número de atletas – “de não termos capacidades logísticas para conseguir juntar muitos jogadores nos treinos” – junta-se o medo de entrar no difícil campo do desporto puro e duro . “Infelizmente ainda não nos sentimos preparados para entrar numa competição contínua, porque sabemos que implicará uma grande maturidade e preparação mental para lidar com potenciais insultos e homofobia”. As palavras falam por si. “Aliás, fomos desaconselhados a entrar numa competição dessas, por agora. Daí nascer este nosso torneio, onde todos podemos ser felizes e genuínos dentro e fora daquelas quatro linhas”.
O Bats InterCup decorre das 09h00 às 18h00 e contará com jogos a todas as horas, com as portas do Pavilhão Nicolau Nasoni abertas para amigos e simpatizantes “que apoiam e entendem a importância da causa”. Sabem que a associação não mudará nada sozinha, mas este torneio ajudará a consciencializar momentaneamente para a inclusão no desporto. Mas não pode terminar aqui. Nada pode ficar por aqui.
Vítor Gonçalves tem ideias do que podia ser mudado, “que a educação física nas escolas incluísse aulas sobre a diversidade no desporto, que houvesse punições reais para cantos de teor homofóbico”. Porque há dúvidas para as quais não encontra resposta: porque nunca houve nenhum jogador profissional homossexual em Portugal? Não se sentiu confortável para o assumir ou foi ostracizado à primeira tentativa? Deixa em aberto. Não tem resposta. Mas também parece já não ser essa a certeza que o move.
O que sabe é que os Douro Bats, à sua escala, irão tentar combater esta “fatalidade”. “Neste sábado estaremos a jogar, com garra, a mostrar quem somos e o tanto que gostamos daquela bola”. Com determinação e empenho, dando mais um passo para a tão desejada inclusão no desporto a nível mundial.
Texto: José Reis
Fotos: Douro Bats
in Ágora Porto – 13 de outubro de 2023